Tuesday, October 28, 2008

"os Vouga"


Realizaram-se nestas datas as regatas do campeonato Nacional desta classe renascida, no campo de regatas da costa Nova onde se criaram e agora se procura que cresçam, numa terceira geração, os barcos da classe "Vouga" .
Esta segunda edição contou com um número record de participantes. Foram nove as embarcações e cerca de 30 os participantes directos nas regatas.
A organização, repartida pela Associação de Classe, APCV, pelo Clube de vela da Costa Nova e pela Federação Portuguesa de Vela esteve bem, a comissão de regatas e o júri resolveram eficazmente todas as matérias inerentes e no final todos os participantes e organizadores pareciam satisfeitos.
As condições meteorológicas foram diversas nos três dias, permitindo velejar em condições de vento muito diversificadas, pelo que poderemos dizer que ninguém saíu favorecido no campo desportivo.
Foi um belo fim-de-semana prolongado, e estiveram presentes dois sócios da CENÁRIO na embarcação "AVentura" que dada a sua provecta idade e o estilo de marear da tripulação não foi além de um nobre 9º lugar.


( segundo algumas opiniões expressas no bar do clube " o único vouga a navegar neste campeonato". Há quem reconheça apenas as linhas clássicas como vougas...)

Tenho ainda a dizer que no campo desportivo se estabeleceram tácticas que tinham como objectivo a victória, mas não só. A associação da classe vouga no seu percurso renovador enveredou por um caminho que aceitou reconhecer como "vouga" três tipos diferentes de barcos. Ora sendo estes modelos diferentes terão obviamente andamentos diferentes, independentemente de quem os manobra. Isto apesar de se reconhecer que num ou noutro caso se poderá verificar algum equilíbrio, mas não será esta a regra, a meu ver. A prova do que digo está nos resultados. Os quatro primeiros lugares do campeonato nacional foram para as novas embarcações em fibra, construidas pelos estaleiros Delmar Conde.
Futuras provas confirmarão o facto de que estará encontrado o modelo de vouga mais competitivo, baseado em projecto de A. Gordinho. *
Se analizarmos os resultados da semna internacional de vela, com os resultados de agora, verificamos que se notam três sub-classes dentro da classe, que resultam dos três modelos de vouga adoptados. O vouga tipo Costa Nova, o Vouga Ria Marine e o vouga clássico, projecto da Brigada Naval.
Portanto se a Classe enveredar por um caminho de continuidade com o que se regulamentou até agora ter-se-há que criar um modo de fazer valer a verdade desportiva. Não quero dizer que os vencedores de regatas e campeonatos até ao momento não o fizeram de forma justa. Se atendermos ás regras estipuiladas os vencedores são justos vencedores. A questão não é esta, e ultrapassa as provas que de momento se vão realizando.
Terá a Associação de Classe reflectir sobre isto e agir.
O problema é que existem outras e complexas questões que não sendo do âmbito desportivo e regulamentar impedem que se faça uma discusão técnica e histórica devidamente esclarecida e elucidativa.
Já diziam os romanos: " Que povo é este que não se governa nem se deixa governar?...."
Voltando à àgua, juntam-se algumas fotos do evento, tiradas no segundo dia de regatas. Pena é não haver fotos de largadas, com a frota toda alinhada.





*
Mas, enganam-se os puristas se pensam que o projecto é de A. Gordinho. Não o é de facto, apenas as linhas geométricas do casco obedecem, em grande parte, ao projecto de A. Gordinho, a embarcação "Bill".Todo o resto é distinto, área vélica, patilhão, linha de água, centro de querena, etc. Portanto em rigor devemos dizer que o projecto é diferente do de A. Gordinho, que como sabemos não realizava projectos para os seus barcos... Esse um grande lapso do pai dos vougas.
( H. Ventura)

Friday, October 24, 2008

"Fraseologia marinhática"

Da necessidade de divulgar o riquíssimo vocabulário náutico português.
Não por uma questão poética, ou de estilo, o que opor si só bastaria, mas porque se trata de uma vertente identitária, nossa , característica genética da civilização portuguesa.




E portanto, aqui se transcreve o texto, publicado em Goa, da autoria do Capitão de Mar e Guerra A ntónio Marques Esparteiro, personagem importantíssima para a cultura náutica.
Recolhi estas informação na "Revista da Armada", nº 404. Leiam e interpretem.


“A Flâmula”
Goa, Dezembro de 1955


FRASEOLOGIA MARINHÁTICA

I
Largada do Mandovi

Por imposição de serviço teve o aviso “João de Lisboa” que subir o Mandovi e ir dar fundo ao ferro pelo través de Pangin, á babugem do cais.
De perfil elegante e marcial, limpo e bem aparelhado, o belo navio, durante vários dias recebeu a seu bordo um sem número de admiradores e atraiu ás margens do rio algumas centenas de curiosos.
Terminada a missão marcou-se a saída para Mormugão de acordo com a maré , de modo a que a água debaixo da quilha deixasse ao nauta uma certa margem de segurança na sua navegação rio abaixo.
Na manhã de 29 de Novembro, içados e metidos dentro os portalós, prolongados os paus de surriola e içadas as embarcações, começou-se a virar ao cabrestante em postos de faina geral como preliminares de saída para o mar.
Na ponte, o comandante, bom oficial de catavento, seguia atento a manobra, pronto a actuar como melhor conviesse.
Pouco depois da última manilha surdir ao lume d` água, o ferro, desunhando entrou a cacear e, em pouco tempo a amarra passou a pique , ocasião em que o comandante começou devagar a evolucionar com o navio para a saída, sem contudo mostrar os machos do leme á nobre cidade de Pangim, como velha usança da Armada de Portugal.
Ferro em cima, safo da fustalha do rio e finda a faina, lá seguiu altaneiro em demanda da boca do Mandovi com água no bico e uma brisa fagueira pelo olho.
A pouca sonda, as curvas apertadas e a curteza dos bordos, obrigou a uma série de elegantes e vistosas evoluções, , que puseram á prova a perícia de quem o dirigia.
Esta pequena travessia, na verdade, requeria uma atenção permanente ás conhecenças, cor da água, e indicações da sonda , pois, de modo algum conviria tocar no fundo.
Felizmente que no catavento pontificava alguém para quem a navegação não tinha segredos e as manobras , ainda as mais complicadas, eram executadas com serenidade imperturbável e precisão impecável.
Àgua aberta com a barra, abocou a saída e, com velocidade moderada meteu queixos ao mar.
Safo dos perigos da barra, em franquia, em elegante giração, tomou o rumo conveniente para Marmagão.
Soprava brisa fagueira, o mar era chico e, nas alturas, brilhava, por entre alguns desgarrados cirros, um sol radioso que a todos envolvia num suave e doce torpor.
O navio lá seguia imponente com a bandeira a drapejar ao vento, mostrando à proa farta bigodeira e deixando pela popa borbotões de água amansada, enquanto o seu perfil elegante subia e descia no horizonte comprido e limpo em harmonioso e doce arfar.
Lá ao longe por bombordo, começaram a lobrigar-se as marcas do porto, primeiro levemente enfumaçadas, sem contornos definidos.
O comandante, sem se fiar no porto da sua fantasia, levava a sua derrota cuidadosamente marcada, como nauta avisado.
No momento preciso, iniciou a manobra para encher as marcas do enfiamento, de modo que a evolução terminasse quando o navio fosse no eixo da barra.
Correu tudo como o excelente oficial concebera.
Percorrida a barra , lá seguiu para o surgidouro de D. Paula, em marcha rápida.
Passou uma barba safa à quadra do “Afonso de Albuquerque” aproou ao ancoradouro e, já em postos de faina, foi largar ferro , poucos minutos depois, em fundo de boa tença, ao abrigo possível da vaga morta de largo.


A. M. Esparteiro