Vougas, Sharpies e Andorinhas - Os Clássicos da Vela Portuguesa (1)
Os Clássicos da Vela Portuguesa
1- Os Vougas
O que é um clássico ?
Cannes, 2022, regates royales ( foto h. ventura)

Não é simples a definição do que é um barco “clássico”, mas não podemos correr o risco de contornar ou evitar a questão.
De um modo geral considera-se
clássico um objeto que se identifica claramente com o tipo a que pertence,
correspondendo a determinado período de tempo e que apresenta características
construtivas e estéticas de elevada qualidade.
Será um objeto ou artefacto
atrativo, que permanece ao longo do tempo preservando as suas características
originais, com frequência atingindo valor emocional e simbólico.
Na evolução dos tipos e modelos dos barcos de regata ou de cruzeiro, seja por motivações estéticas, de disputa competitiva, ou de desenvolvimento económico e tecnológico, estes barcos, agrupados em “classes” foram quase sempre evoluindo e inovando, processo este que foi criando um volumoso e significativo património.
No caso dos Vougas, denominação criada para identificar os barcos de António Gordinho “redesenhados” pelo Sport Algés e Dafundo para a criação da Classe Nacional Vouga, (1939), posteriormente reconhecida pela Federação Portuguesa de Vela (1944), a identificação de um Clássico da classe Vouga revela-se a meu ver, relativamente fácil.
Em primeiro lugar podemos identificar praticamente todas as embarcações que ainda existem, construídas segundo processo construtivo tradicional, respeitando determinados parâmetros e medidas.
Em segundo lugar podemos
localizar no tempo a sua génese e desenvolvimento, que ocorreu desde os anos 30
na Costa Nova, Ìlhavo, até ao estuário do Tejo, e ao Norte do país, perdurando
e mantendo a sua presença navegando por toda a Ria de Aveiro, sobretudo na
Costa Nova, onde se manteve uma frota ativa até finais do séc XX.
E em terceiro lugar porque o Vouga foi construindo,
com a sua presença e performance náutica ao longo de sucessivas gerações, uma
prolífera narrativa de sucesso lúdico-desportivo, cujas micro-histórias se
inscrevem no imaginário coletivo, consubstanciando um raro factor identitário na náutica de recreio.
Portanto, no processo de redesenho e modernização da classe Vouga rumo a uma monotipia desejável e necessária * não podemos nem devemos ignorar e de modo algum limitar, e relevar para segundo plano as embarcações “Clássicas”, que refletem a evolução desta classe e constituem rico e único património.
É pois importante e pertinente que se criem as condições para que estas embarcações e este património persista e continue a navegar e a regatear, com a dignidade que um clássico com esta importância merece.
Sendo a APCV- Associação Portuguesa da Classe Vouga, a entidade que regulamenta e organiza a inserção da classe Vouga junto da comunidade náutica, sendo para isso reconhecida e mandatada pela Federação Portuguesa de Vela, e sendo a atividade desportiva e competitiva a principal razão de ser desta embarcação, torna-se evidente que compete à APCV contemplar, no seu regulamento técnico, ** o conceito e definição de “Vouga Clássico” assim como criar condições para que nas regatas de Vougas estas embarcações participem de pleno direito e com estímulo competitivo.
O que me parece obvio, pelo processo construtivo, pelo que representa em termos evolutivos da vela portuguesa e pelo elevado grau de atratividade e beleza, sem descurar a "performance" náutica e competitiva", os barcos construídos até 1980 constantes da lista de Vougas do Regulamento da APCV, deveriam ser na sua totalidade considerados "Vougas Clássicos", e poder-se-iam replicar, desde que as réplicas fossem réplicas exatas, obedecendo com rigor ao processo construtivo, ás linhas geométricas e ao aparelho vélico. Para eventuais novas construções poder-se-ia definir o projeto Brigada Naval, aquele que historicamente maior número de embarcações produziu, como projeto a ser contemplado.
Deste modo, poder-se-ia criar uma interessante dinâmica no recrudescimento da arte da carpintaria naval segundo técnicas tradicionais, *** preservando saberes e afirmando este pequeno cluster dentro da economia Azul, não colocando em causa a evolução da classe Vouga rumo ao futuro, que será sempre um futuro em construção permanente, com novas técnicas e novos materiais, que permitem uma produção de embarcações em elevado número e por valores acessíveis para poderem equipar as escolas de vela, lugar onde se formam aos futuros nautas e velejadores.
* A monotipia é a característica das classes de vela que reconhecem apenas um tipo e um modelo de embarcação como elegível na classe. Até ao momento, e por razões de contexto histórico decorrente de diversas embarcações denominadas Vouga, a APCV reconhece como Vougas três distintos modelos de embarcação: O Vouga Brigada Naval, o Vouga Mestre A. Gordinho e o Vouga Mestre Alberto. ( Oficialmente -Vouga Brigada Naval - Vouga Costa Nova- Vouga Ria Marine)
** O regulamento Técnico da APCV está em revisão, com o objetivo de formalizar apenas um modelo de "Vouga". Este objetivo justifica-se pela necessária inserção da Classe Vouga no mundo da Vela, inclusive a nível internacional. Também porque tornará a classe mais popular e acessível, espera-se.
*** Não podemos ignorar neste processo a afirmação da carpintaria naval tradicional como fator estratégico para a afirmação da Região de Aveiro. A elevação do barco moliceiro e da carpintaria naval tradicional a Património da UNESCO, a dinâmica da Comunidade Intermunicipal sobre este tema, sobretudo Estarreja e Murtosa, que, ao fomentarem, com a FOR-Mar, cursos em carpintaria naval, permitem-nos uma leitura construtiva e otimista em relação ao futuro.
Cannes, 2022- Regates Royales ( foto h. Ventura)
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