" Vela Areínho e o desvio da agulha"
O charmoso e icónico “Vela Areínho” e sua envolvência podem funcionar como uma estrutura de índole museológica, focada nas memórias e patrimónios náuticos de Ovar e da Ria de Aveiro?
Origem e breve história do projeto “Vela Areínho”
Apartir de finais dos anos 40, a crescente utilização deste aprazível espaço natural, abrigado e sob a sombra de pinheiros, levou alguns utilizadores que ali chegavam sobretudo de barco, a improvisarem apoios de praia e por volta de meados dos anos 50 já ali funcionava uma pequena petisqueira ( tasca do António da Vareirinha)… Esta realidade incentivou a Junta de Turismo do Furadouro, através da Câmara Municipal, a projetar e construir sanitários, chuveiros, bar de apoio, esplanada, iluminação, prancha de saltos para a água, estacionamento... Simultaneamente, iniciara-se a construção do que viria a ser a estrada nacional 327, unindo Ovar a S. Jacinto. Estas obras, de carácter eminentemente moderno, foram inauguradas em 1959 e transformaram radicalmente o local que se revelou fortemente atrativo e cada vez mais frequentado.
A Pousada da Ria, no Muranzel, estaria já na lista de projetos a implementar, e a junta de Turismo de Aveiro viria a construir uma estrutura de apoio a veraneantes, as famosas "Cozinhas" já perto de S. Jacinto. Planeava-se tornar a Ria de Aveiro em um pólo de atração a nível nacional e mesmo internacional.
É pois com naturalidade que surge a possibilidade de financiamento para a construção de um equipamento de restauração e apoio a atividades náuticas na praia do Areinho, pois as infraestruturas de apoio à praia construídas nos anos 50 já não serviam para todo o tipo de públicos que a frequentavam.
Da autoria do arquiteto Cruz de
Lima, e do eng. Braga da cruz, (Técnicos ao serviço da Câmara Municipal de Ovar), foi construído no leito da ria, sobre uma ilha artificial, um restaurante
e estruturas de apoio resultando num belo conjunto, exemplar da arquitetura
moderna na vertente que se veio a denominar de “regionalista”. É possível, pela
linguagem construtiva e pela harmoniosa inserção no espaço “natural” envolvente,
encontrar semelhanças com o projeto de Siza Vieira para o restaurante da “Boa
Nova”, em Leça.
Inaugurado em 1969, foi denominado “Vela Areinho” e desde logo se tornou o melhor espaço de restauração de toda a região da Ria de Aveiro.
Em conjunto com a Praia do Areinho e estruturas de apoio, o restaurante Vela Areínho, a esplanada e os espaços envolventes, atraíam velejadores, veraneantes e visitantes de todo o país, nomeadamente do Porto e de Lisboa. Do Porto pela proximidade geográfica, de Lisboa, pelos fortes relacionamentos sociais, económicos e institucionais de Ovar com a capital.
No início dos anos de 1970 construiu-se o Porto de Recreio do Carregal, ao longo da EN 327. Sobre as dunas, entre o Carregal e o Areínho, construíam-se interessantes moradias de caráter moderno, algumas segundas habitações. A SNADO tornava-se um dos clubes náuticos mais conhecidos e respeitados no meio náutico, nomeadamente pela organização da regata mais emblemática de Ria de Aveiro, o “Cruzeiro da Ria”.
Curiosamente e respondendo a um planeamento ainda muito embrionário, estimulado por linhas estratégicas do poder central, implementavam-se equipamentos, construíam-se
infraestruturas, fomentava-se o investimento, criando-se um excelente pólo de
desenvolvimento. Este conjunto, Areínho, Porto de Recreio, Clube Náutico,
Restaurante, Moradias, Pousada da Ria… faz lembrar, salvaguardando as escalas e
o tempo, o projeto da lagoa de Pampulha em Belo Horizonte, no Brasil, (
Kubichek, Niemeyer, Negrão de Lima, Joaquim Cardozo)
Situação atual
Nos tempos mais recentes, o
restaurante Vela Areínho tem estado encerrado e sem interessados em assumir a
sua exploração. Encontra-se desprovido de equipamentos e mobiliário e já sofreu
atos de vandalismo que resultam em alguns sinais de degradação, devendo ser
tomadas medidas de prevenção e salvaguarda do imóvel.
Os espaços exteriores também se
encontram degradados e a necessitar requalificação e algumas infraestruturas
nomeadamente a iluminação interior e exterior necessitam de ser
intervencionadas.
No entanto, pensamos que não
seria necessário um grande investimento para se retomar o seu funcionamento, tendo
em vista uma nova função, como a que se propõe, proporcionando a "fusão" entre a gastronomia e a náutica, que tão bons resultado promove.
Projeto museológico ? Interpretação de Território? Cozinhar a transversalidade talvez
A originalidade e a
universalidade do tema, o seu carater comunitário e a relação com a identidade
ovarense são fatores valorizadores do projeto, se em confronto com uma
exploração de índole meramente empresarial, devolvendo o espaço á comunidade
Ovarense e a todos os que percorrem a Ria e seus territórios.
A ocorrer, esta transformação
deverá adaptar-se ao edifício existente, mantendo o seu caráter e a conceção
espacial, e as necessárias adaptações poderão mesmo realçar e reforçar a sua
originalidade arquitetónica.
Os espaços exteriores da ilha
onde se encontra implantado o edifício e toda a envolvente imediata, incluindo
o espelho de água contíguo, reforçam esta possibilidade, contribuindo para a
diversidade programática, para o enriquecimento do discurso museográfico e para
o desenvolvimento de uma estreita relação com o território das Rias de Aveiro,
através nomeadamente da navegabilidade.
O programa funcional? Já se encontra elaborado há algum tempo...
Os custos? Custa, mas não muito.
A decisão? Dói, pois desviar a agulha é processo lento, como nas variações do campo magnético...
Mas, lembrando Pessoa, primeiro estranha-se, depois, entranha-se.
2 Comments:
Excelente ideia. Força nisso. Abraço amigo.
Boa ideia. É avançar com ela. É uma clara mais valia para uma zona tão rica e emblemáticas
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